sexta-feira, 22 de novembro de 2013

- Fora do tempo.


- Há ainda esperança na batida do relógio. Doze horas, doze sons, doze vidas. Há, ainda, medo nas batidas. Nas batidas do relógio, nas batidas que eu dou à porta. O olhar cansado que avista o escuro do corredor, o cabelo escasso que cede ao toque, a pele marcada pelo fogo frio da vida. Há ainda sorrisos na batida do relógio. Na batida do relógio e em minha boca seca. Essa boca amarga que profere impropérios contra minha própria sanidade. Essa boca azeda que se apetece por acalentar o mundo e destruir a casa. Essa boca sã, que de tão sã enlouquece todos os dias. Há ainda lágrimas nas batidas do relógio. Nas batidas do relógio e nos meus ouvidos surdos, que de tanto exasperarem com os gritos dos ventos, de tanto encaixotarem as mentiras marcadas, estancaram-se. Há ainda suor na batida do relógio. Na batida do relógio e em meu olho que arde,  que cansa, que insone todas as noites prega peças na minha própria humanidade. Há suor em todo esse corpo perdido, esse corpo que luta, contra o mundo e contra si, numa batalha desproporcional, numa possibilidade de fuga. Ah, o relógio. Quantas coisas há nesse relógio. Quantas almas de pequena monta reconstroem meu heterônomo. Quantos passos esses pés que esfolam caminharam sobre à água. Há ainda esperança na batida do relógio?

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