sexta-feira, 22 de novembro de 2013

- Fora do tempo.


- Há ainda esperança na batida do relógio. Doze horas, doze sons, doze vidas. Há, ainda, medo nas batidas. Nas batidas do relógio, nas batidas que eu dou à porta. O olhar cansado que avista o escuro do corredor, o cabelo escasso que cede ao toque, a pele marcada pelo fogo frio da vida. Há ainda sorrisos na batida do relógio. Na batida do relógio e em minha boca seca. Essa boca amarga que profere impropérios contra minha própria sanidade. Essa boca azeda que se apetece por acalentar o mundo e destruir a casa. Essa boca sã, que de tão sã enlouquece todos os dias. Há ainda lágrimas nas batidas do relógio. Nas batidas do relógio e nos meus ouvidos surdos, que de tanto exasperarem com os gritos dos ventos, de tanto encaixotarem as mentiras marcadas, estancaram-se. Há ainda suor na batida do relógio. Na batida do relógio e em meu olho que arde,  que cansa, que insone todas as noites prega peças na minha própria humanidade. Há suor em todo esse corpo perdido, esse corpo que luta, contra o mundo e contra si, numa batalha desproporcional, numa possibilidade de fuga. Ah, o relógio. Quantas coisas há nesse relógio. Quantas almas de pequena monta reconstroem meu heterônomo. Quantos passos esses pés que esfolam caminharam sobre à água. Há ainda esperança na batida do relógio?

domingo, 9 de junho de 2013

- Quando a solidão passa a ser sua casa.


- Há muito mais frio aqui, onde o escuro mora. Há muito mais medo aqui, onde os esquecidos ficaram. Há muito aqui, mas nós esquecemos. Eu espero que o frio passe. Eu espero que a dor passe. Porque eu sei, eu não posso me salvar, assim como não posso construir sem destruir, como não posso amar sem odiar. O frio aqui ferve minha alma como óleo quente, como a brasa que queima na fogueira acesa. Eu lembro de mim, dos meus olhos, dos seus olhos, de tudo aquilo que arde. Eu lembro da paz, mas eu também lembro da guerra. Nunca é por muito tempo. Eu não sou e nem quero ser ameno, não sou e nem quero ser o mesmo. Eu te mantenho perto, não te mato, nem te coloco tão longe quanto deveria. Eu te mantenho quente, vivo, pulsante. Eu te mantenho em paz. Há muito tempo atrás, talvez mais do que isso, eu não me lembrava do mundo, eu não lembrava de mim. Eu não lembrava das cores, não lembrava dos gostos. Eu não lembrava que podia. Sim, eu podia. Talvez hoje não mais. Eu espero que o frio passe. Eu espero que a dor passe. Eu espero que a gente possa se lembrar.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

- In verso.


- E eu vi as gotas que caíam. Não, não falo da chuva, e seria estranho se eu o fizesse nesse afastamento indivisível que transforma um em dois. As estrelas caminham para o mesmo rompante que os meus olhos se negam a ver, a receber, a perceber. É como se, por ser como o vento, a força e a leveza inexistentes expulsassem todas as pedras que mais me valiam, que mais me completavam. Mas se você nunca tentar, você nunca saberá. E se eu nunca souber, também não seria preciso tentar? Estou em chamas, puramente fogo. E quando se mistura vento e fogo temos uma forma inimaginável, um desalento forte, uma catastrófica vontade, um infinito terminável. Acabo de quebrar todos os copos, todas as luzes e todos os ossos. Acabo de quebrar um por um desses ossos que só me pesam, sem sustentar. Sinto ainda a energia que grita, que pulsa, que te leva pra longe, que me traz pra perto, que nos leva longe e que te prende junto, em comunhão. Sem amor, sem glórias, sem asas que me façam pular sem medo no precipício. Os meus olhos são pardos como a noite parda, como aquilo que não se pode reconstruir, como tudo aquilo que, talvez, eu devesse ter destruído pra sempre. Como eu mesmo disse que seria, como eu mesmo fiz com todo esse vento que me preenche, como eu mesmo quis... E enquanto eu ouvia os carros na cidade e via, ainda mais longe, as luzes que brilhavam dos prédios envolvidos pela noite escura, e imaginava aquela imensidão sem fim, e sentia, por momentos curtos, o vento envolvente tomar meu rosto, eu pude ver, com os verdadeiros olhos que me foram dados. Acho que, naquela hora, descobri o sentido da vida, e, mesmo assim, acho que ela não faz sentido algum. Sentido algum...

PONTO!

sábado, 1 de setembro de 2012

- Vento.





- Homens como eu são como o vento. São como o vento porque mudam, porque passam. Embora sintam a necessidade de ficar, de estreitar e esperar, são obrigados a caminhar. E, dentro do coração, sempre ouvem a voz materna dizendo que 'nós aprendemos da maneira mais difícil que tudo o que nos resta é passar'... Somos tentados pelas luzes daquele farol que nos faz desejar mais do que nunca adentrar nas águas impuras da vivência errante de um mundo incólume. Não se esqueça que o desespero da permanência também leva adiante. Nós pensamos que talvez pudesse haver alguma maneira de nos fazer estar, ficar fisicamente por mais do que minutos em algum lugar, na mente de alguém, mas tudo o que temos é alma e talvez apenas ela possa fazer mudanças. Enquanto isso seremos como o vento, desde a pequena brisa até o mais forte ventaval. Desde o mais caloroso até o frio mais cortante. Seremos como o vento porque vivemos assim, porque devemos ser assim, porque essa é a nossa realidade. E no fim, quando perceber, talvez tenhamos passado, depois de termos mudado o suficiente no mundo. Quando perceber, passamos...

sábado, 21 de abril de 2012

- Precipício.


- Nos olhos desse vento incólume a busca não terminou.  A busca nem começou, por assim se dizer, ela apenas se fez presente para que se lembrasse que havia um rumo. A luz forte da lua incomoda o coração desesperado e as cores fortes das virtudes se tornam tons de cinza perto desse imenso lago vazio. Como se em uma estrada escura e com fortes chuvas, o sol se recusasse a aparecer. Como se em um velho parque as flores se recusassem a brotar. Trovões que sempre aparecem em momentos nos quais a vida quer queimar os que nunca resolveram o que plantar. É como reviver todos os dias os momentos em que o seu mais querido amor entrelaçava seus dedos entre o seu cabelo e tudo parecia em algum lugar. Mas passava... E passa. É se segurar no que pode vir amanhã, nas surpresas que sempre são esperadas. E enquanto esperamos e fazemos o que as regras já inventadas dizem, torcemos para que a sorte sorria, para que a dor seja amenizada, e torcemos ainda mais para ser alguém em algum lugar, para ser alguém em algum mundo, uma parte da história de alguém. Porque, no fim das contas, ninguém quer fechar o seu livro sem um final feliz. Ou, pelo menos, um final interessante. E é por isso que nós fechamos os olhos. Nós queremos ser alguém em algum mundo, alguém dia e noite, alguém que não se vá esquecer tão fácil. E quando levantarmos as mãos para o adeus teremos completa certeza de que os olhos daqueles que ficam serão encharcados pelo que fizemos, pelo nosso vazio e pela nossa dor, mas, acima de tudo, serão embargados pelo nosso amor e pela falta que esse amor, que um dia pode ter parecido tão pouco e pequeno, fará nesse mundo tão frio e desesperado. É... Nós queremos ser alguém em algum mundo!

PONTO!

domingo, 25 de dezembro de 2011

- Mente.

- E nessa noite tudo o que eu posso ver é uma luz quente que envolve o quarto, me afastando por algum tempo de todas as sombras que insistem em bater à porta. A visão da cidade alta que acomete os breves momentos de nostalgia se mostra presente e a alma parece permanecer lá, abandonando um corpo um tanto quanto esgotado pelo medo. É como se a pele saltasse para algum lugar distante, algum lugar intocável, e logo após fosse arrastada de volta ao chão. Pregos se cravam nos pés, pregos se cravam nos ombros e espinhos rasgam os músculos. As mãos desesperadas de quem não tinha o que sofrer, agora salientam o sabor de mais uma noite insone. E o céu, obsoleto em sua observação, só faz piscar mais uma de suas estrelas, buscando de forma irrelevante destinar esperança para os não alentos, buscando desatrelar tudo aquilo que foi unificado. É muito tarde para chamar por alguém agora, talvez alguém que já houvesse se importado, é muito tarde para gritar, chorar ou reclamar. É hora de ficar em silêncio... No silêncio da noite. No silêncio do vento da noite.


PONTO!

sábado, 12 de novembro de 2011

- Pra mim.


- E o mundo girou. Não há nada aqui pra te fazer sentir bem ou mal. Não há nada aqui para nenhuma coisa. O verde se desbotou em um tom pálido, esquálido, inválido. O ar que antes pesava, nem pesa mais. E quando não há outra chance, nem tempo de acordar rápido, muito menos para se sentir aquecido, o mundo gira. E você é como uma vela em meio a um tornado, talvez uma foto sem o foco certo, algo inconformado, deformado para uma realidade a qual não pertence com certeza. Tudo o que se sabe é que a chuva faz falta. O cheiro da liberdade forçada é tão forte que só a chuva consegue amenizar. Nem o Vento o faz. O Vento só voa, intrépido, para algum lugar que nem ele sabe qual. O Vento só voa...

PONTO!